4.10.06

Highlander

Take one
Hoje, à pouco
O meu colega deixou-me perto da Avenida de Roma. Passeei por ela ao fim da tarde, como fazia há 20 anos atrás. Inevitavelmente entrei na Barata, aquela hora quase deserta e perdi-me por ali um pouco. Encontrei-me cá fora e fui até à Bertrand.
Acho que alguns dos meus primeiros livros foram comprados lá. Tenho a certeza que a minha primeira Penthouse saiu dali, debaixo dum braço nervoso, rapidamente transportada para o meu quarto.
Depois deste breve passeio olhei em volta. Já estava escuro. Gosto destes fins de tarde de Outono, quando a noite cai de surpresa. Vi duas lojas e um café que já não existiam mas de cujas histórias eu ainda me lembrava.
Segui pela João XXI, até ao Areeiro. A pé.
Voltava para casa a pé, como antigamente.
Andar a pé por Lisboa para mim é uma coisa única. Só assim é que percebemos verdadeiramente onde estamos e por onde andamos. De carro é demasiado rápido, de transportes é muito confuso. Só a pé é que os espaços e os tempos fazerem sentido.
Só a pé é que vi novamente 2 miúdos a dar carolos num terceiro que tinha engatado uma americana. Só a pé é que vi 4 tipos numa mesa de café a combinar a próxima jogada de um Play By Mail. Só a pé é que vi a casa de uma colega de Liceu a quem eu nunca tinha confessado o meu amor.
Só a pé é que me lembrei novamente da pergunta.

Take two
Num Sábado à noite, depois do Melhor Bolo de Chocolate do Mundo

- Mas quanto te lembras disso, não te sentes velho?... – Perguntou ela. Tinha acabado de virar os 30 e aquela noite era a minha prenda de anos para ela.
Aproveitando a janela panorâmica do restaurante sobre o Saldanha, tinha-lhe contado duas histórias separadas por metros e anos, como um exemplo do que agora sinto quando ando por Lisboa. A pergunta era inevitável e foi feita já nas escadas, quando saiamos.
- Não. Sinto-me… com memória. Cheio de memórias. Mas velho não.

Take Three
Hoje, quase a chegar a casa
Tenho memórias que vão mais fundo do que a vida de muitas pessoas com quem me dou. Lembro-me dum tempo antes de elas terem consciência de existirem.
Mas neste crepúsculo, ao chegar a casa, comigo ia não só o passado, mas também o futuro. Sentia-me novamente como o Highlander no topo da colina, aspirando o ar frio da noite que iniciava.

29 comments:

maria said...

Cá está um post como há muito não escrevias. Bom, mesmo, mas mesmo, mesmo, mesmo bom:)

JPS said...

MARIA: Obrigado. Mas obrigado, obrigado, obrigado, mesmo!

ninfa said...

Estou 100% contigo!
Andar por Lisboa a penantes chega a ser mágico. A luz que bate nos prédios, os cheiros que se misturam, as colinas que subimos e descemos quase sem dar por elas (quase), os eléctricos que passam por nós e fazem-nos perceber que estamos numa cidade cheia de história.
Pena a poluição.

Ana said...

Adoro passear em Lisboa a pé, ao fim de semana bem cedo :-)
Saudades...

Anani said...

Eu não ando de outra forma! Quer dizer, ando de metro... Mas insisto em não andar de carro durante a semana. Nem que seja para manter as pernongas em forma :-)
E é de tal forma que essas memórias estão cá, mas já pouco associadas a Lisboa só por ser Lisboa, já são outros os motores de busca das lembranças.

VF said...

Pois é!

As memórias são a colina onde podemos olhar à nossa volta e voltar a respirar!

Anonymous said...

Fizeste aperceber que raramente ando em Lisboa a pé :-( Não é que tenha muitas oportunidades porque estou a 300kms de distância, mas o curioso é que quando vou a outras cidades (adoro correr Madrid) faço questão de as conhecer e revisitar passo a passo e em Lisboa nunca fiz isso... fica na lista das coisas para fazer! já! Beijos e bom fim de semana xxx

Susana said...

tou contigo! passear por Lisboa passeando pelo passado!

beijoca grande e bom fim de semana

Sereia said...

Sabes que durante suns anos que trabalhei no Campo Pequeno também fiz esse percurso diariamente até à guerra junqueiro, é um optimo passeio em qualquer altura do ano!
Janico eu quero acompanhar o percurso do HighLander!

beijo

ninfa said...

As memórias são qualquer coisa de fenomenal. As recordações são o que nós somos. São a matéria que nos constitui, são a nossa historia. Se não tivessemos memoria não eramos ninguem, porque é a experiencia que molda a nossa personalidade, quem somos hoje e a maneira de vermos as coisas. Eu sou a versão crescida de uma menina que adorava brincar no mar, que era timida com os colegas, que fazia birras para comer e que adorava brincar sozinha. Sou essa pessoa, um bocadinho maior...
E é incrivel como nós moldamos as nossas recordações da maneira que nos convém... muitas vezes só nos lembramos das coisas boas... ou das coisas más. Mas são coisas que nos vamos recordar para sempre. Como aquela sala de aula em que entramos passados 20 anos e vêmos que tem metade do tamanho que nós pensavámos. Mas continua linda e cheia, cheia, cheia de recordações.

Bom já falei de mais... é que as recordações de infância são um tema muito querido para mim ;)

RPM said...

Take Four

Amén, assim seja!

feliz sejas, amigo Zuko.

RPM

Paixão said...

A magia desta cidade...

Anonymous said...

As memórias têm destas coisas...fazem dizer aquilo ue ainda hoje nos provoca ao recuarmos no tempo. Os momentos e o tempo podem ate passar mas ninguém nos arranca a memória e as sensações fortes que com elas carregamos. Também gosto desse diambular por lisboa...sabe sempre tão bem!
Beijitos Zuco.

Pink said...

Ai os Imortais...os imortais...
Ainda ontem recordei com um colega algumas séries de filmes da nossa adolescência. A preferida: Alô, alô.
Ainda te lembras? (acho que houve 1 canal q a repassou há uns tempos)
Mas lembro-me que ao ver os Imortais, desejava ser como ele. Viver para sempre...
Ma squando me recordaram que para assim viver teria de arriscar o meu pescoçinho...ná! Desisti logo. Não me dou bem com armas brancas.
Passear por Lisboa: adoro caminhar pela cidade. Enquanto estudante aproveitei bastantes fins de semana para conhecer a capital.Andava quilómetros! Mas fez-me bem ao corpo e à carteira (estudante não tem mt dinheiro).
Agora além de deambular pelas avenidas, e tenho o meu dinheirito, aproveito para visitar museus e comer em restaurantes ou bares conhecidos.
Da última vez, fui conhecer a igreja do Carmo (fiquei decepcionada. E havia peças no museu q me arrepiaram!)

JPS said...

MACHINE: Ainda bem que falas na luz. Lisboa tem uma luz única (mesmo de noite...)

ANA: Deixa-me advinhar: Ao longo do rio, pelas 4 ou 5 da manhã?

ANANI: Não é tanto por ser Lisboa. Podia ser outro sitio qualquer. ( Para dizer a verdade tenho memórias bem mais importantes em Paris, Coimbra ou na Lousã...) è por mim que passeio, me perco e encontro.

JPS said...

VITOR: Olha que nunca tinha visto a colina sob essa luz...

Woman said...

Ver as memórias desse prisma dá um jeitaço, vou adoptar...

Beijo

Pat said...

E são dias assim que nos dão força para enfrentarmos os que chegam mais cinzentos :)
(sabes que há uns tempos te enviei um mail... mas tu ignoraste-me soberanamente, aí do topo da colina...)

JPS said...

STRESSADINHA: Saiba vossa excelência que conta desde já com um guia, neste seu criado.

JPS said...

SEREIA: Já estás a dar os primeiros passos.

JPS said...

NINFA: Gosto muito que fales demais.

JPS said...

RPM: Take five: Oxalá!

JPS said...

PAIXÃO: A paixão desta vida.

JPS said...

PATY: Obrigado paty.

JPS said...

ZÈ BASTOS: É o preço da fama, meu caro...

JPS said...

PINK: O problema de se viver para sempre é que vais ver morrer todos os que tu amas. Com o tempo, passadas uma gerações, já não te consegues afeiçoar a nimguem. Não vale a pena... E ai percebes que a imortalidade tem um preço: a solidão mas profunda.

JPS said...

WOMAN: Não se dá geito ou não. Mas é assim que as vejo.

JPS said...

TANSOLO: Falha de comunicação superada, minha cara!

JPS said...

CARLOTA: Obrigado!